Favelado, Internacional e Laureado

Em 14 de janeiro de 2020, vivi a felicidade de finalmente me graduar no Bacharelado em Relações Internacionais pela Faculdade Damas. Tive a honra de ser o estudante do curso a receber a láurea acadêmica. Contudo, nada disso foi fácil alcançar e trago uma importante reflexão sobre o tema aqui no Favela Internacional.

Algumas histórias e ideias precisam ser contadas para lembrarmos que existe um mundo real fora das aparências. Trago aqui um pouco da minha experiência de graduação. Repare nessa foto: existe, no meu olhar, uma mistura de orgulho, felicidade, surpresa e descrença por tudo o que estava acontecendo naquele momento. Ao ser nomeado o estudante com a maior nota global do curso, ouvi vários colegas comentando “eu já sabia”. Sei que falaram com boa intenção, mas ainda assim é preciso colocar algumas cartas na mesa, especialmente por eu ser o único, de toda a história, que realmente não sabia.  
Eu não podia ter certeza de uma conquista tão alta pois, na vida aqui embaixo, raramente criamos expectativas sobre coisas que almejamos alcançar até que elas realmente aconteçam. Quem foi contemplado com um benefício como o ProUni, estudou em escola pública e mora em uma “comunidade” como a do Alto José do Pinho – como é o meu caso – sabe que nosso esforço é normalmente 2 ou 3 vezes maior para dar conta de percorrer e concluir uma etapa importante como uma graduação.
A “glória” de ser laureado muitas vezes esconde toda a luta que foi perder 4 anos e meio de sono pelos estudos, e dormir em algumas aulas por cansaço. Cansaço esse que vinha, na maioria das vezes, pela necessidade de trabalhar que começou meses antes de eu ter minha 1ª aula na faculdade em 2015 e que, dado o meu contexto, precisei continuar trabalhando durante toda a graduação. Sem contar as longas e apertadas viagens de ônibus entre uma coisa e outra. Na minha condição, foi necessário fazer os sacrifícios que ninguém estava disposto a fazer, e projetar mais esforço depois que todas as energias já haviam se esgotado.
Nesse processo, entretanto, ressalto que não fiz nada sozinho, pois sem a instrução e paciência dos meus ótimos professores e o suporte e parceria dos meus colegas e amigos, chegar até o fim não seria possível. E esse era todo o meu objetivo, chegar até o fim. Conseguir um pouquinho mais do que os meus pais não puderam. A necessidade de transformar todas as coisas para melhor era o que me mantinha de pé nessa massacrante metamorfose que é subir na vida através da educação.
O que resta, portanto, são duas coisas: 1) reconhecer a complexidade e a dificuldade que é alcançar as coisas na vida, precisando de muito esforço, e no fim do dia ainda viver praticamente nas mesmas condições; 2) e se orgulhar e celebrar o fato que mesmo com todo esse cenário, mesmo não almejando tal excelência, ainda assim foi possível chegar lá. Afinal de contas, eu acredito que ser grato e feliz pela conquista não exclui a importância de refletir como chegamos nela.
 

– Adaptado de um texto publicado originalmente nas mídias sociais de Wesley Siqueira em 27/fev/2020].

 

  • Imagem destacada: Arquivo pessoal.
  • Após mais de um ano sem publicações, esforçarei-me para voltar a publicar meus textos aqui no blog. Tenho muitas coisas para contar!

 

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